quinta-feira, 12 de março de 2009

O Brazil não conhece o Brasil



“Popozuda” e “máquina de sexo” são alguns dos adjetivos pelos quais brasileiras são chamadas lá fora. As nomenclaturas foram retiradas do livro Rio for Partiers (Ed. Solcat), espécie de guia turístico sobre o Rio de Janeiro, e revelam uma realidade vergonhosa: o Brasil não é visto sem conotações sexuais. É ainda mais constrangedor dizer que este livro foi escrito por um brasileiro (Cristiano Nogueira), e que o próprio país construiu – e constrói – esta visão deturpada.

Segundo a pesquisadora Louise Prado Alfonso, escritora do TCC Embratur: formadora de imagens da nação brasileira, a empresa que divulga o país no exterior é a culpada pela expansão do conceito sexual. De acordo com Louise, desde 1960 as mulheres são incluídas à paisagem natural e “vendidas” como mercadoria a estrangeiros. Ela contou ao Jornal da Unicamp, que a sexualidade não passou de uma estratégia comercial: “Os documentos da Embratur contam a preocupação dos governos em vender o Brasil como produto para os mercados interno e externo”.

O que foi solução antes, hoje é problema que precisa ser combatido, já que a cultura brasileira foi incondicionalmente relacionada ao sexo, inclusive pelos nativos. Heinar Maracy, editor da revista Windows Vista, afirma que a prostituição contribui: “No exterior, consideram nossas mulheres fáceis”, comenta. “Nossa cultura foi acorrentada a isso. Os gringos só conhecem o comércio sexual, o Carnaval”, ironiza.
A festa citada por Maracy é um exemplo da visão quase que inconsciente que os próprios brasileiros têm do seu país, e que precisa ser mudada. “Carnaval não é mulher nua. É uma festa popular. Às vezes, as peladas atrapalham a visão de quem quer ver com profundidade a riqueza do desfile. Insistem na exibição dos corpos nus aqueles que não têm o que dizer ou mostrar”, explica ao O Estado de S. Paulo o jornalista Chico Pinheiro.

Outro exemplo é o funk carioca, apontado no “guia” como música produzida por um “retardado num piano eletrônico”. O DJ holandês Eboman, que veio ao Brasil em janeiro, discorda e revela “Não entendo português, mas adoro funk. A batida é atraente e é isso o que importa”. Ele acredita que o ritmo é uma forma de expressão e de protesto. “Se as letras não agradam, tendem a ilustrar o modo de vivência de uma comunidade, o que quase nunca é bem-vindo”.

O depoimento do DJ mostra que nem todos enxergam só o sexo. É o que tenta provar a italiana Silvia Capucci, que criou o projeto Stop sexual Turism, em 2005. “Muitos turistas viajam com o intuito de ficar com a mulher brasileira, que já está incluída no pacote de viagem”. Quatro anos após a campanha, nada mudou. Como previsto na canção de Maurício Tapajós e Aldir Blanc, famosa pela interpretação de Elis Regina, o Brazil não conhece o Brasil. E a maior parte do Brasil, também não.

domingo, 18 de maio de 2008

Objetividade?


Muito se discute, atualmente, sobre objetividade jornalística.

Quando se fala no assunto, logo vem à mente a idéia de textos claros e sucintos que valorizam, antes de tudo, a informação em si, de modo que o leitor possa entender e interpretar a mensagem de acordo com seus conceitos, e não da forma como o meio no qual essa mensagem é publicada deseja.

Entretanto, é impossível que a objetividade, vista dessa forma, aconteça, graças a uma série de fatores, a começar pelo próprio autor do texto: todos nós carregamos uma bagagem cultural diferente, isto é, cada sujeito possui determinados valores e conhecimentos que outros, ainda que de um mesmo grupo, não têm – o que possibilita uma interpretação também diversificada sobre qualquer evento. Assim, não é possível sequer escrever um texto sem a inserção, ainda que indireta, das ideologias de quem o faz.

Além do mais, nessa questão ideológica, é importante observar que as empresas que publicam os textos jornalísticos também possuem visões políticas próprias, e esse fator é muito mais determinante, talvez, que qualquer outro a ser citado.

E há, também, a linguagem, que interfere na mensagem final: o texto chamado “objetivo” costuma ser retratado em terceira pessoa, na tentativa de negar a existência de um “eu”, de uma voz que assuma as idéias nele contidas. Mas para que haja notícia, é preciso haver história, e para que exista história, é necessário “enfeitar” o discurso para criar, quase de maneira teatral, atrativos para o leitor/espectador.

Ora, com tantos recursos gramaticais, conforme o texto Objetividade Jornalística: eis a questão!, o redator assume o papel de “contador de histórias”, uma vez que, apesar de utilizar métodos científicos para a construção de textos, perde-se em superficialidades que servem apenas para entreter os consumidores.

E por falar em entretenimento, eis o problema-chave. Não que a diversão e a ausência de pautas realmente sérias sejam ruins, ao contrário: em uma sociedade capitalista, é fundamental que haja meios de distração e lazer, pois somente desse jeito é possível agüentar as pressões da rotina de trabalho impostas à maior parte da sociedade. Porém a substituição de pautas sérias por entretenimento prejudica de forma imensurável a percepção de mundo de que toda a população necessita.

A disputa acirrada das empresas por um público cada vez maior – situação que se encaixa, obviamente, em um contexto social capitalista – faz com que elas busquem fatos inéditos a serem descritos de modo fantástico, para que o interesse do público seja despertado. Dessa forma, notícias que proporcionam maior número de audiência passam a ocupar o espaço de outras muito mais importantes, ou seja, muitas vezes um acontecimento histórico é sufocado por um caso estrondoso, que não afetará direta ou indiretamente a população, porém é muito mais chocante visualmente.

E, com isso, surge a perda de credibilidade: ora, se um meio de comunicação deixa de noticiar aquilo que é de suma importância para ceder a impulsos meramente lucrativos, perde-se, aí, o respeito pela população; com um feito desses, ausenta-se o discurso central da objetividade jornalística, que é atender à sociedade de forma direta e verdadeira.

Não que a objetividade de uma notícia resuma-se apenas a uma verdade única, sem as ideologias do enunciado, afinal, é humanamente impossível chegar a esse ponto; ao contrário, a objetividade jornalística é descrita em diversos manuais e por inúmeros autores mais como um método a ser buscado que como uma doutrina. Ela surge para orientar o trabalho do jornalista em sua pesquisa diária: é na objetividade que se encontram os princípios básicos do jornalismo como, hoje, é conhecido, tanto nas empresas como no meio acadêmico, e é, muitas vezes, só por discórdia e visão preconceituosa de um modelo americano (já que os EUA foram os maiores responsáveis pela implantação do modelo jornalístico atual) que criticam a objetividade, que nos trouxe noções importantes, como a distinção entre opinião e notícia, além da obrigatoriedade de precisão, interesse, veracidade etc.

Portanto, é a preocupação com o mercado antes da preocupação com a seriedade que transforma o conceito de objetividade jornalística em mera utopia. Isso porque, apesar de nenhum texto, como fora afirmado anteriormente, estar livre de ideologias, é possível, sim, construir bons argumentos, notícias que permitam ao público refletir e tirar conclusões próprias, apresentar todas as versões de um fato. Ao subestimar ou ignorar acontecimentos importantes, porém, que qualquer indício de objetividade – em um contexto geral, e não subestimando o trabalho de apuração, que pode ser muito objetivo, do jornalista – é perdido e torna-se irrevogável.

Para ler mais

Objetividade jornalística: is a questão

Crítica ao desconstrucionismo do jornalismo

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Para ler, interpretar e refletir

O saudosista
Por César Homero Silveiro


Sabemos que o tempo nunca volta.
E o velho, será sempre mais velho...
E que um dia os novos serão também...
Velhos!
Deleitaremos todo nosso prazer...
Em recordar-se...
De tudo e todos que vivemos.
Amores, odios, cidades, amigos...
Meras pessoas passarão por nós!
Outras miúdas, talvez porcentagem nula...
Nos faram falta, e trarão dor pela ausencia!
Viver com este encargo, é um destino...
faze-lo menos doloroso é apenas uma virtude.
Questão de tempo... o mesmo que lhe envelhece.
Roubão-lhe a vida, o tempo... e nunca saberás...
Jamais descubrirá, quem lhe faz este furto.
Lougrado ficamos longe... distante.
De tudo que amamos.
Eu, você, o cão da rua, o gato esperto.
E todos um dia perdemos algo...
Muitas vezes perdemos muitas coisas...
Que não nos farão falta...
Outras vezes...
Perdemos parte de nossa história.
E nossa passagem por aqui...
Fica vaga, triste e saudosista!

Gata borralheira


Por Sirlene Farias

Você acorda atrasada pela manhã. Em vez de um bom-dia, o que ouve são os gritos de sua mãe, falando, como sempre, de sua irresponsabilidade quando o assunto é escola. Forçada a despertar – porque acordar e despertar estão longe de ser sinônimos –, você corre para o banheiro para um "rápido" banho e se aprontar para a escola. Ao pentear os cabelos (que teimam em ter vida própria) diante do espelho, depara-se não com uma, mas com várias espinhas sobre sua pele que, até ontem, era lisinha como a pele de um bebê. Para completar, olheiras arroxeadas, que, possivelmente, indicam que você andou chorando novamente escondida embaixo dos lençóis. Mais uma decepção amorosa. A sensação de fracasso perdura e não é nada amenizada quando você chega à escola e dá de cara com aquelas garotas que, aparentemente, nasceram e vão morrer perfeitas. Na escola, porque é lá que as decepções normalmente acontecem, você acaba tendo de conviver com ele. Aquele garoto de sorriso lindo, eu faz suas pernas tremerem somente com um olhar, o qual só vai em sua direção quando você está atrapalhando o caminho. Meses se passaram e você não foi notada e, apesar de tudo isso, você continua sem olhar para os lados, imaginando que pessoa maravilhosa ele é e que você é a pessoa ideal para estar ao lado dele. O que fazer a partir de então? Não tenho o intuito de dar uma receita infalível sobre como atrair a atenção do rapaz mais lindo da escola para você, já que eu, particularmente, jamais consegui tal proeza. Também não vou dizer um modo de você se tornar irresistível da noite para o dia, pois, se eu soubessem já teria me casado com o Thiago Lacerda ou qualquer outro bonitão. O que pretendo é tentar discutir o Complexo de Cinderela, que cresce com muitas garotas e que pode, sim, acabar em algo mais sério, como a depressão. Eu, a Cinderela do século 21
Cinderela foi uma garota que perdeu a mãe muito cedo. Seu pai, tempos depois, acabou se casando com uma outra mulher ambiciosa que, com suas filhas igualmente interesseiras, foram viver na casa em que Cinderela já vivia com o pai. Este não era muito presente, deixando livre o caminho para que essa madrasta maltratasse sua enteada. Um dia, todas recebem um convite para um baile, ao qual a pobre Cinderela é proibida de ir. Triste e sozinha, a menina chora, mas logo é acolhida por sua fada madrinha, que a prepara para o baile. Lá, ela conhece seu príncipe encantado e os dois se apaixonam imediatamente. Ao soar meia-noite, ela foge para que o encanto não se quebrasse e esquece seu sapatinho, que é encontrado pelo príncipe. Este decreta que se casará com a garota cujo pé couber no sapato. Cinderela consegue prová-lo, casa-se com o príncipe e os dois vivem "felizes para sempre." É claro que todas já ouvimos essa históri
a antes e todas já sonhamos com o nosso "feliz para sempre". Podemos, então, nos fazer algumas perguntas: existem muitas Cinderelas no mundo, mas existe um príncipe encantado para cada uma delas? Quem são esses príncipes encantados que procuramos? Por que os procuramos com tanta vivacidade? E o meu "feliz para sempre", vai ser para sempre mesmo? Se algum dia em sua vida você já se fez uma dessas perguntas, fique aliviada. Você é uma pessoa completamente normal. Se achou um absurdo questionar a existência de um par perfeito, comece a se preocupar. Você provavelmente está com o complexo de Cinderela. Trata-se de um complexo em que a garota busca o homem perfeito, que se encaixe em todos os seus pré-requisitos e que não possua nenhum defeito. É a busca incessante por alguém que complete sua lista de expectativas, sem nenhuma exceção, culminando, por fim, numa pessoa sozinha, que não consegue relacionar-se com ninguém pelo simples fato de idealizar exageradamente um namorado perfeito. E, pior, não consegue imaginar sua vida sem ele. É difícil acreditar que em plena atualidade haja garotas que todavia acreditem que não existe vida sem um garoto perfeito ao lado para paparicá-la e, acreditem, sustentá-la. Depois de tanta luta pela independência feminina, algumas mulheres ainda acham que o homem é quem deve sustentá-las. Calma aí! Não acha que isso está indo longe demais não? Eu por mim mesma Um primeiro passo a ser dado para dar início ao fim desse complexo é olhar-se no espelho ficar, no mínimo, satisfeita. Tudo bem que não somos perfeitas e ninguém pode ter o sorriso da Kate Hudson somado aos lábios da Angelina Jolie e às pernas da Penélope Cruz. Além disso, não temos o dinheiro delas... Se não gosta do cabelo escorrido e sem vida, mude a cor, por exemplo. Acha que está acima do peso, procure um médico para dar início a uma dieta adequada, vá para a academia, enfim. O estereótipo tem solução, e algumas são bem simples. O passo seguinte é cuidar da mente. Devemos, de cara, acostumarmo-nos à idéia de que nenhuma pessoa é perfeita, portanto, é dar adeus à listinha de pré-requisitos a serem preenchidos. Conseguiu fazer isso? Excelente, é um dos passos mais importantes e mais difíceis. Entender as diferenças das pessoas começa aceitando nossas próprias características, como as manias, por exemplo. Outro ponto importante é olhar para os lados. Não precisa girar a cabeça em 360 graus (literalmente porque é impossível fazê-lo sem quebrar o pescoço, figurativamente porque você acabará no mesmo lugar e não é esse o intuito...). As pessoas legais estão mais perto do que imaginamos e, deixando de idealizar, poderemos chegar à conclusão de que aquele príncipe tão admirado não passa de um garoto metido, chato e arrogante... nem sempre a conclusão é essa, mas ela acontece constantemente. Ao fim de tudo, você notará que o mundo real é bem mais interessante que o mundo dos contos de fada e que é essa complexidade do ser humano que deixa o mundo tão divertido. Agora, algumas garotas, as mais Cinderelas, devem estar se perguntando "e o meu feliz para sempre?". Responder é simples, Vinícius de Moraes já havia respondido, ainda que cada um tenha sua leitura "Que não seja imortal, posto que é chama / mas que seja infinito enquanto dure". Curta com intensidade os bons momentos de sua vida e seja feliz!


Se você quer ler um pouco mais e discutir sobre o assunto, acesse:


Um pouco mais humano


Por Carlos Ignatti

Saí do abrigo como há muito não fazia, mas diferentemente de qualquer outra saída que eu já tinha dado, fui propenso a reflexões. Analisava com mais frieza os atos banais para olhos contemporâneos.
Na cidade, em meio à multidão, fiquei fixo num eixo apenas girando e acompanhando as cenas que mais me chamavam a atenção.
As pessoas notavam meu comportamento estranho e minhas vestimentas que eram pouco convencionais para o padrão urbano. Mas eu não era visto como aberração, apenas como uma pequena anomalia, e a cidade está cheia de anomalias, então eu era quase normal e quase membro da sociedade.
Olhando em todas as direções possíveis, vi uma mãe nervosa e apressada puxando pela mão uma criança tão pequena que teria dificuldades para subir alguns degraus de uma escada, ou teria de ficar de pé na cadeira para almoçar junto à família, no domingo. A criança chorava, pois sua chupeta caíra da boca, e a mãe, muito apressada, não quis parar para pegar. O choro da criança era alto e triste e, ouvindo aquilo e vendo a cara de tristeza daquele pe
queno bloco de massa viva, me senti triste e meu coração se encheu de piedade.
A chupeta foi chutada por um pé desavisado e os dois sumiram, em meio à multidão. Minha piedade, então, deu lugar a outro sentimento, o da apatia, porque, apesar de ter sentido a tristeza da criança e sentido pena dela, apenas olhei e não intercedi, pegando a chupeta.
Virei rapidamente minha cabeça procurando fugir daquilo e, do outro lado, vi ser assaltada, em meio à multidão, uma mulher feia e com o nariz tão grande que devia consumir duas vezes mais oxigênio que eu. O ladrão puxou a bolsa e correu muito. As pessoas apenas olhavam e comentavam a cena, mas ninguém nem ao menos socorreu a mulher. Vi que todos eram tão apáticos quanto eu para as tristes situações da realidade, então, me senti tomado pelo sentimento de conformismo.
Isso me levou a olhar as pessoas circularem e, como numa lousa, toda aquela cena se apagou dando lugar novamente ao transitar de rostos sem uma mensagem clara para mim.
Virei-me bruscamente para trás procurando algo melhor, diferente, quando uma mulher enorme esbarrou em mim, jogando minha sacola para bem longe. Ela não parou e não pediu desculpas e nem olhou para trás, apenas continuou sua vida como se, de certa forma, não tivesse invadido a minha. Fui tomado por um sentimento de ódio, senti vontade de bater naquela mulher, que era alta e forte e sem educação e apática como eu e todas as pessoas que passavam por ali naquela hora, pouco se importando com o mundo, e menos ainda comigo.
Dando-me conta disso, vi que nenhum homem ou mulher deste mundo era digno de respeito. Éramos todos seres egoístas preocupados apenas com o pequeno universo que gira em torno de nosso imundo umbigo, mas que
num todo não é maior que uma ponta de agulha. Senti nojo de mim e de todos os que passavam pela calçada naquele momento.
Disposto a gritar todo o meu ódio para a multidão, fui interrompido por uma pequena mão puxando minha camisa e oferecendo de volta minha sacola, que a pouco voara de minha mão. Um garotinho que eu nem conhecia, de no máximo dez anos, vestindo uma camiseta vermelha, tinha saído de não sei onde apenas para pegar minha sacola e devolve-la para mim. E, além disso, ele sorriu e disse, “tó moço, você derrubou!”.
Só pude agradecer e ver o garotinho educado e sorridente, que vestia uma camisa vermelha, voltar para a mão de seu pai que olhou para mim e também deu um sorriso.
Sucumbi, me entreguei ao caos quando os meus olhos se encheram de lágrimas e me senti um ser mais asqueroso ainda por ter julgado toda uma sociedade como desprezível, sem antes ter conhecido o garotinho sorridente e seu simpático pai.
Agachei ali mesmo e comecei a chorar e a sentir medo de, apesar de meus anos de vida, não ter entendido nada e de ninguém ter me entendido ainda. Senti medo de ter sido tomado por todas aquelas sensações e talvez não estar fazendo o julgamento correto. Perguntava-me que tipo de ser podia sentir tudo aquilo e dar importância para tantas coisas bobas e ter chamado a atenção das pessoas com um comportamento estranho e ter errado no julgamento que fiz delas.
Morri por um instante, mas refleti e depois compreendi que eu era normal, eu era comum, que tudo que eu havia feito ou sentido, apesar de não fazer parte de um estereótipo-padrão, era apenas comportamento humano e que eu não deveria me martirizar, mas apenas aceitar as coisas e conviver com
isso, e tentar mudar o que eu achava errado, mas não querer mudar o mundo.
Levantei com um sorriso triunfal no rosto, pronto para voltar ao meu abrigo, mas nem precisei fazer muito esforço. Neste instante, quatro grandes mãos vindas de dois grandes corpos, um negro e um branco, me agarraram e me jogaram para dentro de uma ambulância velha, cheia de pontos de ferrugem e que me levaria de volta ao abrigo. Eles usaram de força e falaram palavrões, mas nem me importei, o caminho que eu andaria, gastando ainda mais a sola de meu sapato preto, agora seria feito rapidamente de ambulância.
Os dois estavam bem nervosos, não sei bem com o quê, e sentaram na frente, mas pude ouvir o grande corpo negro dizer, “Por que eles fogem? Me responda! Eu não estou mais agüentando este trabalho...”.
Talvez um dia ele devesse ficar parado no meio de nós, dentro do abrigo e, depois, ficar no meio da multidão, vendo as pessoas passarem. Isso, talvez, responderia a sua, e o ajudaria a entender melhor as coisas.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

O desenhista é como uma puta

Infelizmente, em nosso país, arte não é algo lá muito “importante”. Quando falamos em desenho, então, a coisa piora um pouco mais. Para ilustrar o assunto e apresentar a problemática, a seguir, confira uma entrevista com o Roe Mesquita, que é formado pela Fábrica de Quadrinhos, Especialista em ilustrações, invenção personagens, arte-sequêncial e criações em geral no ramo.

Qual é a maior problemática em ser um desenhista?
Bem, no Brasil, existem diversos problemas. O desenho, aqui, não é cultural, é o tipo de ofício que paga pouco, então, se você quiser fazer um trabalho diferente ou um projeto próprio, tem que tirar dinheiro do seu bolso, porque nem o governo nem as empresas ajudam nessa área.

A maioria dos trabalhos vem de que setor?
Para ser desenhista aqui, você só consegue trabalhar na área de estamparia e ilustrações para empresas, na maioria das vezes.

Em outros países a coisa é mais fácil?
Sim, porque o desenho é cultural. Por exemplo, na Europa, o desenhista é supervalorizado... Lá, é possível fazer uma HQ com um prazo de um ano para finalizar e ainda ganhar um bom dinheiro.


Há quanto tempo você trabalha com ilustração?
Há seis anos

Qual foi o melhor trabalho que você já fez? Eles pagaram bem?
Foi da Ulhôa (que presta serviços para a IBEP). Tive de fazer 80 e poucos desenhos em um prazo de dez dias. Pagaram o justo... mas bem, não.
E qual foi seu pior trabalho? Por quê?
Nossa... Bem, não foi o pior trampo, mas foi um bem chato. O cliente me pediu uma coisa, e eu mandei o esboço para ele. Quando o cara aceitou, eu finalizei e fiz tudo certinho. Daí, ele resolveu que não queria mais daquele jeito, quis mudar umas coisas... Eu falei que esse era um novo desenho e eu teria de receber por ele. O cliente não gostou.

Qual é o lado mais legal de trabalhar com desenho?
Ah, é que você consegue criar as coisas, realizar sonhos pessoais, consegue transferir a realidade para um desenho de uma forma mais simples ou muito sofisticada.

O que é mais chato?
Trabalho chato é aquele em que o cliente quer demais e o prazo é muito curto, como cinco desenhos para três dias, por exemplo.

É possível viver de desenho no Brasil?
Se você tiver sorte ou Q.I. para alguém te colocar em uma empresa, sim, é possível viver de desenho no Brasil. Agora, se você vive de freelance não, porque nem todo mês há serviço.

E trabalho fixo é só com sorte, ou experiência, estudo e outras coisas ajudam?
Sim as outras coisas ajudam, e muito. Mas conheço ótimos profissionais com inúmeros cursos que estão fazendo freela, pegando trabalho de três em três meses.

Mas, então, a idéia é aproveitar as oportunidades para crescer?
É bem por aí... Por exemplo, eu fiz uma HQ para o Canadá sem ganhar nada, só para divulgar meu nome... O criador da HQ me colocou como co-produtor do trabalho, então, eu criei os personagens e tudo mais. Assim, ele me deu um voto de confiança, curtiu meu trabalho, meu profissionalismo... E começou a divulgar meu trabalho para alguns conhecidos dele do exterior. Daí, comecei a pegar alguns serviços. É assim que funciona a vida: contatos são essenciais.

Para finalizar, qual é a sua dica para quem quer trabalhar com desenho no Brasil?
Não ao ufanismo e não ao plágio; sim à influência e à criatividade.



Se você quer conhecer o trabalho do Roe, acesse http://roe-mesquita.deviantart.com/
Se você quer rir e fazer cursos, acesse http://www.fabricadequadrinhos.com.br/
Se você quer saber por que o desenhista é uma puta, aí vai mais um motivo para acessar o Deviant do Roe.

domingo, 9 de dezembro de 2007

Independência para o cinema, oportunidades para o Brasil

A produção independente no cinema ganha cada vez mais espaço na medida em que novas mostras e eventos surgem. O próprio cinema, por sua vez, conta com pessoas que se empenham em fazer transparecer – por intermédio das telas – realidades que se ocultam nas mais diversas formas. Dessa maneira, as expressões artísticas finalmente ganham seu merecido reconhecimento.


Segundo a estudante de jornalismo e cinéfila Suelen Almeida, 19, as mostras internacionais crescem também por conta do esforço dos estudantes e atuantes da área. “Atualmente, essas pessoas procuram criar roteiros e participar de diversos eventos, workshops e encontros; eles correm atrás do trabalho e ainda arranjam tempo para montar oficinas de produção e roteiro para quem curte cinema, mas não têm oportunidade de estudar. Isso acaba incentivando uma produção independente ainda maior”, afirma.
Assim, todos ganham em interação: a atriz, autora, diretora e estudante do quinto semestre de cinema da Universidade Anhembi Morumbi, Gisela Arantes, ilustra bem o cenário. Ela participou, em agosto deste ano, do Festival de Gramado, com o curta Cézar, o imperador urbano. O filme retrata a vida dos moradores de rua, e, mais que isso, é um encontro entre dois mundos diferentes: o de uma estudante e um desabrigado. Arantes conta que o personagem principal é, inclusive, interpretado por quem representa essa classe. “Na verdade, a história é um pouco autobiográfica. Eu conheci o Airton – que interpreta o Cézar – quando estudava no cursinho e me preparava para entrar na Faculdade de Cinema. Dois anos depois, reencontrei e o convidei para participar do filme. Além do Airton, dirigi outros não-atores, como o meu professor de história. Particularmente, gosto dessa união de atores e não-atores”.
Gisela colabora, ainda, em outras áreas sociais: “Escrevi, dirigi e coordeno um projeto de educação ambiental itinerante, o Planeta Água Mata Atlântica. Ele possui um espetáculo de teatro e já beneficiou mais de 100.000 crianças gratuitamente. É o quarto ano que o realizo pelo Brasil”.
O trabalho dos atuantes em cinema se transforma em produção de qualidade, o que gera eventos, novos contatos, novas idéias, lucros financeiros (alguns festivais, como o de Gramado, trazem inúmeros turistas, o que, conseqüentemente, faz a economia do país deslanchar) e a sociedade ainda ganha um presente: esses produtores e diretores valorizam a arte, mas, com todas as dificuldades, não se esquecem das necessidades sociais.